terça-feira

"O Bom Sacerdote" - Arquimandrita Gregorios (Estephan)

 





O Bom Sacerdote

 

Arquimandrita Gregorios(Estephan) – Hegúmeno do Mosteiro da Dormição da Mãe de Deus - Bkefitine

 

O sacerdócio cristão é uma ocupação celestial, não terrena, porque o verdadeiro sacerdote é designado por Deus, não pelos homens, e o objetivo é, antes de tudo, conduzir o povo de Deus ao Reino dos Céus.

 

É dever de todo cristão buscar sua salvação, e isso requer um líder e um professor para liderá-lo e ensiná-lo a arte da salvação. O sacerdote Ortodoxo é este líder e mestre que é chamado, pela graça do sacerdócio que lhe foi confiado, a celebrar os Santos Mistérios e auxiliar os outros na sua salvação. Mas ele mesmo deve ter encontrado o caminho para sua salvação e trabalhar para isso com seriedade. Apesar da importância de todo o trabalho pastoral e do ensino do sacerdote, sua vida em Cristo e sua luta na vida de piedade e virtude precedem todo trabalho.

O trabalho principal do padre é espiritual, mas seu trabalho pode facilmente se transformar, de espiritual em atividade social, devido a dois fatores: o primeiro fator é a fraqueza em sua vida espiritual, especialmente em sua oração. O segundo fator, que vem como consequência do primeiro, é a influência de sua Paróquia, por causa da tirania do fator social sobre o espiritual, que pode ocorrer ali. É por isso que a seriedade do sacerdote de Cristo é demonstrada pelo seu empenho em santificar-se. Ele resiste não apenas a toda influência mundana e externa sobre si mesmo, mas afeta seu rebanho e dirige suas mentes e vidas de maneira espiritual, para a salvação de suas almas.

O Evangelho separou radicalmente o espírito de Deus e o espírito do mundo. É impossível resistir ao espírito do mundo na alma humana sem a vida ascética. O amor do sacerdote por Cristo é expresso por sua renúncia ao mundo e a tudo o que há nele, e também por seu desejo de oração e jejum, e sua vigilância na luta incansável contra suas paixões e pecados. A oração pessoal de um sacerdote não deve cessar, nem por um dia, nem ele deve quebrar o jejum, independentemente das circunstâncias pastorais que possa encontrar. Isso constitui um pecado e uma entrega ao espírito deste mundo e a todos os seus desejos, e uma pedra de tropeço para seu rebanho; também os encoraja a negligenciar o jejum. É por isso que o jejum é mencionado tão estritamente nos cânones sagrados.

Deus alegremente aceita o jejum de Seus sacerdotes como uma indicação de sua aversão a seus desejos pecaminosos. Ele ouve atentamente as orações daqueles que lutam por Ele, o que prova que eles O amam mais do que a si mesmos; tais sacerdotes agradam a Deus com fé e obras. Algumas pessoas pensam que nossas obras e serviço são suficientes para agradar a Deus, mas sem uma fé forte e reta em nosso Cristo, nossas obras, por maiores que sejam, não passam de um trapo de imundícia diante dEle.

O amor do sacerdote por Cristo é mais evidente no Mistério da Eucaristia. A participação neste Mistério requer pureza de corpo e alma. O padre se prepara para a Comunhão dos Mistérios através da oração e jejum da noite anterior. Ele se prepara com muito silêncio e sua regra (canon) de oração diária. O silêncio e a oração dão ao sacerdote um estado de vigilância interna, para poder examinar seus pensamentos todas as noites e purificar sua mente de todo pensamento maldoso ou ódio, especialmente em relação àqueles que o ofendem. O sacerdote deve rezar por aqueles que o ofendem e se reconciliar com eles, considerando que Deus lhe envia tais pessoas para preservá-lo na humildade. Só a humildade abundante permite ao sacerdote conhecer a si mesmo e ver suas transgressões como pecados, de modo que não as justifica, mas se arrepende delas. O arrependimento é a primeira condição para ser digno de participar dos Mistérios Divinos.

 

A Paróquia sente a virtude do padre e sua vida de piedade - se ele reza, jejua, se arrepende, perdoa e ama. Ao mesmo tempo, também sente sua ganância e todas as suas paixões. Pois a graça do sacerdócio não esconde as paixões do sacerdote. As mais perigosas entre essas paixões são os desejos da carne, o amor ao dinheiro, a ira, a vaidade, o egoísmo e o temperamento. Quanto mais fortes essas paixões estiverem dentro dele, mais inevitável será sua queda no pecado.

O início da queda de um padre é o seu afastamento gradual da confissão de suas paixões e pecados a um pai espiritual, e sua queda se cumpre quando ele se vê perfeito em tudo e não aceita nenhuma crítica de ninguém. Quando o padre perde a vida de filho, ele perde imediatamente a posição de pai. Quando os pecados se acumulam, ele não os vê mais como pecados porque satanás os justifica para ele e o faz esquecê-los, lembrando-o apenas de suas glórias. O orgulho cresce gradualmente no padre quando ele começa a aceitar pensamentos de superioridade e altivez sobre si mesmo, dados seus talentos e a honra e confiança de seus paroquianos. Recusar a honra do povo, ou mesmo desconsiderar e fugir dela é o princípio da salvação; quando (o sacerdote) se considera o menor entre os homens e indigno, sendo concedido, pela graça e compaixão de Deus, a sustentar as coisas sagradas em suas mãos e celebrar estes mistérios temíveis. Deus ama os humildes porque eles se arrependem. Ele resiste aos orgulhosos.

Na era do globalismo religioso e do sincretismo, o sacerdote não deve ceder nenhuma parte da verdade para agradar sua Paróquia, nem em termos de fé nem dos Mandamentos. Que o sacerdote confie que Deus iluminará os humildes para que possam mudar e abraçar a Verdade ensinada pela Igreja, junto com seus Santos Concílios, enquanto os orgulhosos que resistem a essa Verdade, acabam se tornando mais insistentes em suas opiniões e convicções pessoais inspiradas pelo espírito do sincretismo.

A imagem de Moisés, e das pessoas que reclamaram com ele no deserto por quarenta anos, é uma imagem das tentações que um padre que luta pela salvação de seu povo pode encontrar em qualquer Paróquia. Como o sacerdote precisa de uma alma fortalecida pela Graça, para não fraquejar e sucumbir, ele precisa rezar incessantemente para que o Senhor ilumine seu povo no conhecimento da Verdade, implorando com lágrimas [para] que [eles] se arrependam e que encontrem a salvação. A oração de arrependimento atrai a graça do Espírito Santo, de modo que Deus é o líder deste povo, enquanto o sacerdote nada mais é que um instrumento de Deus, como outro Moisés. O sacerdote deve sempre desenvolver sua fé em Deus e confiar somente nEle, e não em si mesmo, ao pastorear seu povo. O trabalho pastoral requer paciência, paciência requer oração, e oração requer negação do amor próprio. Ele deve amar os pecadores, não os julgar ou evitá-los.

O sacerdote não deve se cansar de comemorar os nomes dos vivos e dos adormecidos no Divino Sacrifício, suplicando o perdão de seus pecados. A oração e o Divino Sacrifício oferecido pela vida de todo o mundo, antes que venha o julgamento deste mundo, é o que mantém a Graça de Deus operando neste mundo em meio a todos esses males e transgressões. Estes nomes comemorados, juntamente com o nome da Mãe de Deus e dos santos, são misturados ao Sangue de Cristo que foi derramado para nossa salvação, sendo comemorados no Santo Altar, naquela Divina Liturgia, onde o Céu e a terra, vivos e mortos, estão unidos.

É por isso também que a Divina Liturgia deve ser celebrada em todos os lugares, em todas as Paróquias, também aos sábados*, que são dedicados aos adormecidos. É dever do sacerdote recordar sempre aos fiéis que rezem pelo repouso das almas dos seus irmãos adormecidos e pelos necessitados deste Santo Sacrifício. Pois eles ainda estão vivos e compartilham conosco no mesmo Corpo de Cristo. Que o sacerdote confie que ele contribui para a consolação e conforto dessas almas, comemorando-as no Santo Sacrifício. A Divina Liturgia de sábado é tão necessária quanto a de domingo, onde lutamos e rezamos pela ressurreição de nossos entes queridos.

- O Verdadeiro Sacerdócio -

Como o bispo e o sacerdote se tornam verdadeiros sucessores dos Apóstolos e membros dessa “nuvem de testemunhas”(Hebreus 12:1)? A imposição de mãos não é suficiente. A imposição de mãos e a própria sucessão Apostólica são anuladas por qualquer desvio, mesmo que leve, dos dogmas da Fé. A Verdade Ortodoxa está acima de tudo; é o dogma reto; é o próprio amor e todas as outras virtudes; é a única lei sobre a qual se fundamenta toda a salvação em Cristo. Ensinar e defender a fé é um dever inseparável da ordem sagrada do bispo e do sacerdote. É por isso que foi estabelecido — para pastorear o povo de Deus — mas nas pastagens da fé reta, e não nos desertos dos ensinos distorcidos e do espírito da época. O bispo é, antes de tudo, um zeloso guardião da unidade da Igreja dentro da fé Ortodoxa; no momento em que as heresias são legalizadas como uma perversão, a Verdade Ortodoxa é dissolvida nelas

São Teodoro o Estudita diz: “Pois é um mandamento do Senhor não ficar calado no momento em que a fé está em perigo. Fala , diz a Escritura, e não te cales (Atos 18:9)... É por isso que eu, o miserável, falo, temendo o julgamento de Deus”.

 

Conhecimento e graus acadêmicos não são uma medida do sacerdócio; são apenas fatores suplementares. A medida é a pureza interior do homem, sua luta espiritual em obediência e sua absoluta fidelidade à Fé Ortodoxa e à Tradição da Igreja. Estas são as condições gerais do sacerdócio de que falaram os nossos Santos Padres. Caso contrário, o padre será um fardo para a Igreja, enchendo-a de pedras de tropeço. O bispo será responsabilizado por cada ordenação que não cumpra essas condições, especialmente no que se refere à fé.

O sacerdote autêntico é identificado com Cristo por meio da obediência, não da autoridade. A autoridade é completa e canônica quando se baseia na obediência. A obediência limita-se à fidelidade absoluta aos dogmas e cânones definidos pela única Igreja de CristoOs mandamentos de Cristo e os cânones da Igreja são uma lei divina que deve permanecer sempre diante dos olhos do sacerdote, dia e noite. Esta é a sua luta em um mundo que aboliu todos os estatutos sagrados que Cristo estabeleceu para o Seu mundo; nesta última era que prega, aberta e persistentemente, a lei do anticristo.

O bispo não herda o dom de profecia que existia nos profetas do primeiro século do cristianismo? Ele é designado profeta para proclamar a Verdade e revelar a ilusão vindoura ao seu rebanho. Entramos nos últimos tempos e os fiéis a Cristo esperam que alguém lhes revele o espírito do anticristo, que está operando poderosamente no mundo agora.

O bispo ou padre iludido por esse globalismo religioso, difundido pelo movimento ecumênico contemporâneo, e que, em nome do amor, mistura a Verdade Ortodoxa com várias ilusões, que salvação oferecerá ao seu rebanho? Ele só será apresentado como sendo um mau exemplo e tendo uma fé corrupta. Tal bispo ou padre esqueceu que ainda carrega o Cordeiro que lhe foi confiado durante sua ordenação – um penhor a ser entregue do mesmo modo como O recebeu – o depósito de sua primeira Fé e seu primeiro amor.



Abouna Gregorios (Estephan)

 

* O sábado é o dia em que tradicionalmente se comemora e se reza pela memória dos adormecidos. É costume monástico a celebração da Divina Liturgia em cada sábado.  Essa tradição, de qualquer modo, infelizmente caiu em desuso na maioria das Paróquias.