quinta-feira

Sobre o Monasticismo e o Casamento ( Metropolita Hierotheos de Nafpaktos)





por Metropolita Hierotheos de Nafpaktos



Dividimos as pessoas entre "monges e casados", e a vida entre "monástica e conjugal", e o resultado é que elogiamos a vida monástica, que consideramos melhor e mais adequada para guardar os mandamentos de Deus, enquanto menosprezamos a vida conjugal como não adequada para a prática da vontade de Deus.


De fato, sabemos muito bem que a Igreja enaltece os dois modos de vida, tanto a vida monástica quanto a vida conjugal. Mas isso não significa que uma seja louvada às custas da outra. E, nesse ponto, devemos dizer que se aplica a interpretação da Parábola dos Talentos, que mencionamos anteriormente.


Pode-se afirmar que na Igreja as pessoas não são divididas simplesmente em não casados e casados, mas em pessoas que vivem em Cristo e pessoas que não vivem em Cristo. Assim, por um lado, temos pessoas que têm o Espírito Santo e, por outro, pessoas que não têm o Espírito Santo. Além disso, na Igreja primitiva, como parece nas Epístolas do Apóstolo Paulo, todos os cristãos, não casados e casados, viviam como monges, porque até mesmo o casamento tem seu ascetismo. Portanto, se algum monge critica o casamento em Cristo, ele mostra que tem um problema com a sua vida monástica, e se uma pessoa casada critica e olha com desconfiança para a vida monástica, isso significa que ela tem um problema com a maneira como está vivendo sua vida (de casado). Um bom monge nunca critica o que Deus elogia (como o casamento) e uma boa pessoa casada nunca critica nada que Deus elogia, como a vida monástica. É característico que a melhor homilia sobre a virgindade tenha sido composta por São Gregório de Nissa, que era casado; e um homem não casado, Santo Anfilóquio de Icônio, escreveu coisas excelentes sobre a vida conjugal. Além disso, não nos esqueçamos de que São Paphnoutios defendeu o casamento para o clero no Primeiro Concílio Ecumênico.


Em sua homilia, Santo Anfilóquio de Ícônio mostra que o cristão é um homem cathólico, em outras palavras, completo. Ele elogia a virgindade e o casamento. Ao falar sobre a virgindade, ele diz sobre o casamento: "O matrimônio digno se eleva acima de toda dádiva terrena, como uma árvore que dá frutos. . como uma raiz de virgindade, como um cultivador dos ramos racionais e vivos". Em seguida, ele diz: "Retire a dignidade do matrimonio e você não encontrará a flor da virgindade". Além disso, a comparação é entre duas coisas dignas, porque Santo Anfilóquio diz: "Dizendo essas coisas, não estamos introduzindo uma luta entre a virgindade e o casamento; admiramos ambos como mutuamente devedores". Para concluir, ele diz caracteristicamente: "Pois sem o conhecimento devoto das coisas divinas, nem a virgindade é modesta nem o matrimônio é digno".


E o Santo Crisóstomo ensina muitas coisas sobre esse assunto. Ele diz: "Pois nossos casados têm tudo em comum com os monges, exceto o casamento". Todas as pessoas devem se adaptar aos mandamentos de Cristo. Portanto, o Santo Padre diz caracteristicamente: "Se formos moderados, nem o casamento, nem a alimentação, nem qualquer outra coisa nos impedirá de sermos agradáveis a Deus". Se o casamento e a criação dos filhos fossem nos impedir de seguir o caminho da virtude, o criador de todas as coisas não teria trazido o casamento para a nossa vida"


O que Basílio, o Grande, diz também é característico: "Todos nós, monges e casados, somos obrigados a obedecer ao Evangelho".


Portanto, não podemos justificar nossa indolência pelo modo de vida particular que escolhemos, nem podemos criticar e descartar outro modo de vida que não seja como o nosso. Sem dúvida, existem graus e etapas espirituais.

 

sábado

Os Magos do Oriente e a Estrela

 




“E, tendo nascido Jesus em Belém de Judéia, no tempo do rei Herodes, eis que uns magos vieram do oriente a Jerusalém, Dizendo: Onde está aquele que é nascido rei dos judeus? Porque vimos a sua estrela no oriente, e viemos a adorá-lo”... “E, tendo eles ouvido o rei, partiram; e eis que a estrela, que tinham visto no oriente, ia adiante deles, até que, chegando, se deteve sobre o lugar onde estava o menino.

E, vendo eles a estrela, regozijaram-se muito com grande alegria.

E, entrando na casa, acharam o menino com Maria sua mãe e, prostrando-se, o adoraram; e abrindo os seus tesouros, ofertaram-lhe dádivas: ouro, incenso e mirra.

E, sendo por divina revelação avisados num sonho para que não voltassem para junto de Herodes, partiram para a sua terra por outro caminho.” (Mateus 2:1-2, 9-12)


Os Magos do Oriente (μάγοι ἀπὸ ἀνατολῶν) citados neste trecho do Evangelho do Santo Apóstolo Mateus, provavelmente eram sacerdotes pagãos oriundos da Pérsia. Também podemos encontrar este termo atrelado à casta sacerdotal dos Medos, já que os gregos antigos costumavam classificar os Persas e os Medos como sendo um mesmo povo. O que de fato sabemos é que eram homens que lidavam com a interpretação de sonhos, vidência e astrologia.


Não temos a intenção de tratar dos magos em toda a sua amplitude, menos ainda nas divergências que saltam de diversas tradições cristãs, de Leste a Oeste: quais seriam seus nomes, número e práticas, para além do que nos é apresentado pelo Evangelista. A prática da astrologia por parte destes homens nos é clara e nela iremos nos atentar.


Estes magos eram homens cultos, vindos de uma região que viu o nascer e o sepultar de diversas civilizações, e versados nas mais diversas tradições e ciências. Sabemos que eles, como astrólogos, acreditavam (entre outras coisas) que os astros mantinham algum tipo de influência na criação como um todo, inclusive - e principalmente - no homem, coroa da Criação. Mesmo assim, apesar de cultos e convictos de suas crenças, não podemos apresentar condenação aos magos quanto a este erro relacionado à 'coroa da criação', afinal, a Verdade em sua plenitude não havia sido revelada ao entendimento humano e isso só aconteceu após a Encarnação. Foi através de Cristo que o homem conheceu seu verdadeiro propósito. O homem, em corpo, alma e espírito, ainda não havia sido escancarado em todos os seus labirintos. São Nicolau Cabasillas diz que antes da Encarnação, o homem sequer poderia encontrar a plenitude da justiça, quanto mais a Verdade [1]. Deus, que revelou a Si mesmo através da Pessoa de Cristo, também revelou ao homem o verdadeiro motivo de sua existência: tornar-se deus através da Graça [2]. Os magos não poderiam saber disso, apenas conceber minimamente, em pequenos espasmos causados pela 'semente do Verbo' que neles existia. Porém, no todo, estavam cegos como qualquer outro homem de seu tempo. Assim, dimensionando e compreendendo o homem de modo incorreto, os magos incorriam neste erro.


Porém, se os magos em seu desconhecimento "estavam livres" para cometer este erro, o mesmo não acontece conosco. Não gozamos do privilégio deste álibi. Somos nova criação, herdeiros de Cristo e de Sua Verdadeira Fé. Revestidos de Cristo pelo Batismo, somos chamados a não “servir a dois senhores”. E é exatamente disso que a astrologia se trata: servir a dois senhores.


A Estrela: 


Como dito anteriormente, os magos ainda não compreendiam a Verdade, eles não estavam sob a rocha da Verdadeira fé, o que os fazia percorrer a criação atrás de sinais que pudessem apontar para Aquele que esperavam ansiosamente. E o Senhor os atendeu, mas não se utilizando dos astros que já existiam, aqueles sobre os quais os magos buscavam suas respostas. A estrela que os guiou não era uma estrela comum, acessível aos homens através de seus ciclos. São João Damasceno nos explica este fenômeno: "Muitas vezes também acontece que surgem cometas. Estes são sinais da morte de reis, e eles não são nenhuma das estrelas que foram feitas no início, mas são formados ao mesmo tempo por ordem divina e novamente dissolvidos. E, portanto, nem mesmo aquela estrela que os magos viram no nascimento do Amigo e Salvador do homem, nosso Senhor, que se fez carne por nós, é do número daquelas que foram criadas no princípio." [3] Alguns Padres ainda afirmam que a estrela era nada mais do que algum poder angélico: "Quando você ouvir ‘estrela’, não pense que era uma estrela como a que vemos, mas um poder divino e angélico que apareceu na forma de uma estrela."  [4] "...esta estrela não era do tipo comum, ou melhor, não era uma estrela, como parece pelo menos para mim, mas algum poder invisível transformado nesta aparência, é, em primeiro lugar, evidente a partir de seu próprio curso" [5]


Não foram os “ciclos astrológicos” que guiaram os Magos, mas Deus, que o fez através deste sinal formado e dissolvido instantaneamente, sendo totalmente desconhecido por eles. "Os Magos, vendo o estranho curso de uma estrela desconhecida e recém-brilhante, que excedia o brilho de toda a luz celestial, aprenderam assim que Cristo Rei nasceu na terra, em Belém, para a nossa salvação." [6]. Usando assim de algo que lhes era familiar para trazê-los à Verdade.  "Como os Magos eram astrólogos, o Senhor os trouxe de maneira comum [a eles], como Pedro, sendo um pescador, saiu da multidão dos peixes." [7].


Apesar de ter se utilizado deste aspecto da fé dos magos, Deus não tinha a intenção de legitimá-la. Pelo contrário. Ele poderia muito bem ter se utilizado de alguma estrela já existente, conhecida dos magos, mas não o fez. Sua intenção não era confirmar suas crenças, e sim aniquilá-las. A estrela no nascimento de Cristo, anunciando a presença de Deus Encarnado, era tão brilhante,tão diferente de tudo o mais [nos céus], que a magia [dos magos] foi destruída, todo vínculo de maldade desapareceu, a ignorância foi dissipada e o antigo reino abolido."[8] Naquele exato momento, durante aquele evento, Deus aboliu completamente a fé e as práticas dos magos, apontando para uma nova e Verdadeira Fé, que havia sido anunciada já no ventre da Virgem e agora despontava na história naquela humilde manjedoura. Segundo o entendimento da Igreja, os próprios Magos aceitaram que suas práticas estavam completamente sepultadas pela encarnação do Deus-homem, obrigando-os a mudar de rota e abandonar a sua antiga prática da astrologia [9]. Fazendo um contraponto com as atitudes posteriores dos judeus, São João Crisóstomo nos diz sobre os Magos: "Considerando que os Magos reconheceram que a vinda de Cristo encerraria seu conhecimento profano e suas artes mágicas, os judeus não aceitaram que o Legislador acabasse com seus sacrifícios e se recusaram a aceitar os mistérios da dispensação divina. Os Magos confessaram um estranho; os judeus rejeitaram um dos seus" [10] Criticando a insensatez de quem defende a prática da astrologia com base nos magos, o mesmo Santo sentencia o fim desta prática: “O que eles alegam, então? Eis que, dizem eles, mesmo quando Cristo nasceu, uma estrela apareceu, o que é um sinal de que se pode confiar na astrologia. Como, então, se Ele nasceu de acordo com essa lei, Ele acabou com a astrologia, eliminou o destino, tapou a boca dos demônios, expulsou o erro e derrubou toda essa feitiçaria? [11]


O testemunho dos Padres é inequívoco: nos magos temos a abolição e o sepultamento da astrologia, não sua justificativa. Onde muitos buscam um pretexto para sua prática, a Verdade determina o seu fim. Nos resta escolher: ajoelhar-se diante do Deus Encarnado, como fizeram os magos, ou seguir o amargo sussurro do demônio.


Indo adiante, apesar de esclarecido totalmente esse ponto, muitos ainda podem argumentar: "mas são obtidas respostas quando consultamos as estrelas e muitas delas são benéficas para minha vida". São questionamentos próprios da mentalidade moderna, que apesar de falsamente pragmática e muitas vezes dissimulada, acaba sendo incontornável em nosso século. Porém, cabe a nós afirmar que nem todo resultado obtido, sejam quais forem os meios utilizados, pode ser considerado inerentemente "bom" pelo simples fato de existir. E sendo supostamente "bom", não pode ser automaticamente considerado como tendo parte com a Verdade. A procedência é algo realmente importante e deve ser levada sempre em consideração. Em Atos 16 podemos ler  sobre o encontro do Santo Apóstolo Paulo com uma jovem que predizia o futuro através de um espírito imundo. Ao ver Paulo e outros Apóstolos caminhando, ela começou a segui-los por dias, anunciando: “Estes homens são servos do Deus Altíssimo e lhes anunciam o caminho da salvação"(Atos 16:17). Estas palavras, colocadas em sua boca pelo espírito imundo, eram totalmente verdadeiras. Porém, vemos como o Apóstolo Paulo lidou com isso: “Paulo ficou indignado, voltou-se e disse ao espírito: "Em nome de Jesus Cristo eu lhe ordeno que saia dela! " No mesmo instante o espírito a deixou. (Atos 16:18). É assim, pois o demônio não trabalha pela Verdade, ainda que, na busca pela nossa perdição, ele possa circunstancialmente dizer palavras verdadeiras. Isso nos mostra a necessidade urgente de compreendermos corretamente o que é a “Verdade” do ponto de vista Ortodoxo, para que não caiamos no erro dos que a vinculam com qualquer ideia criada pela mente humana, retorcendo-a em uma simples engrenagem de autojustificativa e orgulho.



  

[1] Nicholas Cabasilas, “The Life in Christ”, 55-56

[2]Theosis: The True Purpose of Human Life, 21

[3] An Exposition of the Orthodox Faith (Book II) - Chapter 7. Concerning light, fire, the luminaries, sun, moon and stars.

[4]Theophyiact (785-840), PG. 123:61.

[5] St John Crysostom, ""Homily 6 On the Gospel of Matthew"

[6] Matins Canon of the Nativiy of Crist, Ode Nine, Mode One

[7] St Theophyiact (785-840), PG. 123:61.

[8] St Ignatius, 'Letter to the Ephesians'.19

[9]  Tertullian, On Idolatry, 9.

[10]John Chrysostom, Sermon for the Epiphany, Holy Apostles Covent, “The Lives of the Holy Apostles”, 202  

[11] St John Chrysostom, ""Homily 6 On the Gospel of Matthew"



trechos do artigo  “Notas sobre a Ortodoxia e a astrologia” - (em processo de edição)


terça-feira

Uma Profecia sobre a Futura Iniquidade

 




De uma carta do Ancião de Optina [e Novo Mártir] Santo Anatólio, o Jovem (+1922)

"...A partir daí, as heresias se espalharão por toda parte e enganarão muitas pessoas. O inimigo da raça humana agirá com astúcia a fim de atrair para a heresia, se possível, até mesmo os eleitos (Cristãos Ortodoxos).


Ele não começará rejeitando grosseiramente os dogmas da Santíssima Trindade, a divindade de Jesus Cristo e a virtude da Mãe de Deus, mas começará, imperceptivelmente, a distorcer os ensinamentos e os estatutos da Igreja e seu próprio espírito, transmitidos a nós pelos Santos Padres por meio do Espírito Santo.


Poucos perceberão essas artimanhas do inimigo, apenas os mais experientes na vida espiritual. Os hereges tomarão o poder sobre a Igreja e colocarão seus servos em toda parte; os piedosos serão vistos com desprezo. Ele (o Senhor) disse: "Pelos seus frutos os conhecereis", portanto, pelos seus frutos, bem como pelas ações dos hereges, esforce-se para distingui-los dos verdadeiros pastores.


Esses são ladrões espirituais, que saqueiam o rebanho espiritual, e entrarão no aprisco (a Igreja), subindo por outro caminho, usando a força e pisoteando os estatutos divinos. O Senhor os chama de ladrões (cf. São João 10:1). De fato, sua primeira tarefa será a perseguição dos verdadeiros sacerdotes, sua prisão e exílio, pois sem isso será impossível para eles saquear as ovelhas.


Portanto, meu filho, quando você vir a violação da tradição patrística e da ordem divina na Igreja, a ordem estabelecida por Deus, saiba que os hereges já apareceram, embora por enquanto eles possam esconder sua impiedade, distorcendo a Fé Divina imperceptivelmente, a fim de ter mais sucesso em seduzir e atrair os inexperientes para a sua rede.


A perseguição será dirigida não apenas contra os sacerdotes, mas contra todos os servos de Deus, pois todos os que forem dominados pela heresia não suportarão a piedade. Reconheça esses lobos em pele de cordeiro por seu caráter orgulhoso e amor ao poder. Eles serão caluniadores, traidores, semeando inimizade e malícia por toda parte; por isso o Senhor disse que pelos seus frutos os conhecereis. Os verdadeiros servos de Deus são humildes, amam o próximo e são obedientes à Igreja.


Os monges serão muito oprimidos pelos hereges e a vida monástica será desprezada. Os mosteiros se tornarão escassos, o número de monásticos diminuirá e os que permanecerem sofrerão violência. Esses odiadores da vida monástica, entretanto, tendo apenas a aparência de piedade, se esforçarão para atrair os monges para o seu lado, prometendo-lhes proteção e bens mundanos e ameaçando de expulsão aqueles que se opuserem a eles.


Essas ameaças causarão grande desespero entre os covardes, mas você, meu filho, regozije-se por ter vivido até aquele momento, pois então os fiéis que não demonstraram nenhuma outra virtude receberão coroas apenas por permanecerem firmes na fé, de acordo com a palavra do Senhor (cf. São Mateus 10:32).


Tema o Senhor, meu filho. Tema perder a coroa preparada (para você), tema ser lançado por Cristo nas trevas exteriores e no tormento eterno. Permaneça corajosamente na fé e, se necessário, suporte a perseguição e outras tristezas, pois o Senhor estará com você... e os Santos Mártires e Confessores olharão para você e sua luta com alegria.


Mas ai dos monges que, naqueles dias, estarão presos a bens e riquezas e que, por amor à segurança, estarão prontos a se submeter aos hereges. Eles adormecerão sua consciência, dizendo: "Estamos preservando e salvando o mosteiro e o Senhor nos perdoará". Os infelizes e cegos não consideram de modo algum que, por meio da heresia, os demônios entrarão no mosteiro e, então, ele não será mais um mosteiro santo, mas apenas muralhas das quais a Graça se afastará.


Deus, no entanto, é mais poderoso do que o inimigo e nunca abandonará Seus servos. Os verdadeiros cristãos permanecerão até o fim desta era, mas escolherão viver em lugares isolados e desertos. Não tema as tristezas, mas sim a heresia perniciosa, pois ela nos tira a Graça e nos separa de Cristo. É por isso que o Senhor nos ordenou que considerássemos o herege como um pagão e um publicano.


Portanto, meu filho, fortaleça-se na graça de Jesus Cristo. Apresse-se para confessar a fé, para suportar o sofrimento como um bom soldado de Jesus Cristo (cf. II Timóteo 2:13), que disse: Seja fiel até a morte, e eu lhe darei uma coroa de vida (Apocalipse 2:10).


Porque a Ele se deve toda honra, glória e domínio, juntamente com Teu pai Eterno e o Espírito Santo. Pelos séculos dos séculos. Amém.


Por Que os Cristãos Não se Arrependem nos Dias de Hoje? - Arquimandrita Gregórios (Estephan)




Arquimandrita Gregorios(Estephan) – Hegúmeno do Mosteiro da Dormição da Mãe de Deus - Bkefitine


Por que as nações se desintegram e novas nações surgem? Por que muitas nações cristãs desapareceram, sendo substituídas por nações pagãs? Nos últimos tempos, quando o mundo inteiro conspirar contra o Senhor e Seu Cristo, o cristianismo lutará pela sobrevivência. Isso exigirá a adesão à Verdadeira Fé em Jesus Cristo.


Por que Deus está abandonando Seu povo? Talvez porque Ele seja um Deus vingativo? Certamente que não! Pelo contrário, Ele é o Deus perfeito que deseja filhos perfeitos, que anseiam por alcançar a perfeição; filhos que guardam fielmente Seus mandamentos e se apegam à fé que foi colocada em suas mãos. Nosso Deus quer apenas uma coisa de Seu povo: fidelidade. Ou seja, Ele deseja que eles O obedeçam com fé e não mintam para Ele; que não finjam devoção enquanto vivem em pecado; que não falem sobre abnegação enquanto vivem egoisticamente com desejo de poder e vanglória; que não se orgulhem da Ortodoxia enquanto a traem em seus diálogos.


O Senhor pede que Seu povo seja fiel a Ele, e somente uma coisa preserva essa fidelidade na alma humana: o arrependimento. O arrependimento é o retorno incessante a Deus. Seus sinais são um espírito contrito e humilde, que abandonou todas as coisas terrenas e busca a misericórdia de Deus com toda a sua mente. Quando o povo se afasta de Deus, Ele o disciplina, não como um ato de vingança, mas para torná-lo consciente de seu pecado, para que possa se arrepender. Desde os tempos do Antigo Testamento, Deus tem dito ao Seu povo: Convertei-vos, agora, cada um do seu mau caminho, e fazei boas as vossas ações, e não sigais a outros deuses para servi-los (Jer. 35:15).


O cristão vai atrás de outros deuses de duas maneiras: quando aceita a heresia como verdade e quando segue o espírito do mundo e se rende à sua maneira de pensar.


Deus sempre desejou que tivéssemos uma fé pura nEle - a fé saudável que Ele revelou ao Seu povo e que leva à salvação. Entretanto, alguns distorceram essa fé e brincaram com ela. O surgimento de heresias e inovações dogmáticas está fortemente relacionado às paixões humanas corruptas, especialmente o orgulho. Desse orgulho maldito e da desobediência surgiram todas essas chamadas "igrejas". As paixões cheias de maldade e arrogância, como o orgulho - que se alimenta do amor-próprio - e as paixões de desejo de poder e vanglória, que são infladas pelo amor às coisas terrenas e obscurecem totalmente a alma, fazendo com que ela interprete os dogmas da fé pelas lentes de sua própria vontade e pensamentos. Essa escuridão espiritual afasta a alma do espírito de contrição e arrependimento. É exatamente por esse motivo que Deus despreza a heresia e a condena, chamando-a de blasfêmia imperdoável contra o Espírito Santo. Ela é uma reminiscência do orgulho primordial que desfigurou o caminho da salvação; ela também impede que a alma se arrependa e seja salva.


O espírito do mundo enfraqueceu a vontade do homem e dispersou sua mente, tornando-o incapaz de se lembrar de Deus no coração. Esse espírito substituiu os valores e as virtudes que eram usados para educar as crianças (como o autocontrole) por vícios (como a entrega a paixões imundas e a obediência aos desejos do corpo e às tendências animalescas). Esses vícios se tornaram deuses para o homem, substituindo o único Deus verdadeiro. Quando o homem adota o espírito da era moderna e permite que ele domine seu pensamento, sua vontade é despedaçada e sua mente fica paralisada: ele deixa de estar atento à Verdade e é incapaz de adquirir o espírito de arrependimento.


Em toda Escritura, Cristo insistiu em separar o espírito do mundo do Espírito de Deus. O espírito do mundo semeia o desdém pela Verdade eterna e suas coisas sagradas, enquanto incita subliminarmente o pecado e o ateísmo na mente do homem. Portanto, aqueles que se esforçam para modernizar a Igreja, seu phronema (mentalidade) e sua práxis (modo de vida), são os primeiros inimigos de Cristo, pois misturam a verdade com a ilusão, que Cristo se esforçou para separar.


A própria Igreja, que possui esse profundo senso da Verdade Divina transmitida ao longo de sua história, tem se rendido ao espírito do mundo ultimamente. Quantos, mesmo entre os fiéis, estão incentivando a adoção das reformas doutrinárias e morais produzidas pelo espírito do mundo! Pessoas como essas não reconhecem a existência de heresias, inovações ou mesmo demônios, nem acreditam em uma Igreja ou mesmo em um Deus.


Quem afirma que a Verdade é encontrada em todos os lugares, mesmo fora do cristianismo, está realmente cego, amortecido para a Verdade; ele se tornou um instrumento adúltero para o demônio da ilusão. Como esse homem pode se arrepender? Quando o senso da Verdade única morre em nós, o próprio Deus morre em nós.


O arrependimento requer muita humildade, para que o homem possa estar ciente de sua pecaminosidade e contemplar a Verdade Divina. É por isso que São João Clímaco diz que é impossível encontrar humildade nos hereges: Toda heresia, mínima ou flagrante, é fruto do orgulho e da arrogância demoníaca. O principal perigo do movimento ecumênico moderno é que ele reforça na alma humana o orgulho e as convicções, em vez de incentivá-la a se arrepender e buscar a verdade. O dom da verdade é concedido pelo Deus da Verdade aos penitentes que abandonam sua vontade própria e seus próprios pensamentos e buscam a Verdadeira Fé com oração incessante.


A Igreja não mente. Em vez disso, os mentirosos são aqueles que tentam misturar a verdade com a falsidade, justificando suas violações da fé. Os orgulhosos não se arrependem, não importa quão louváveis sejam suas ações terrenas ou quão grande seja sua benevolência, porque eles glorificam a si mesmos, e não a Deus. Quanto aos humildes, eles se arrependem porque se conhecem verdadeiramente e se entregam incondicionalmente a Cristo pela fé. O grande pecado do homem não está na transgressão de um único mandamento, mas em seu orgulho e insubordinação à Igreja e a seus ensinamentos verdadeiros.


Nem todas as pessoas orgulhosas são hereges, mas é possível que todos os hereges sejam orgulhosos. O Senhor não permite que os humildes se afundem na ilusão ou sofram a condenação eterna, mas fornece a eles os meios para conhecer a verdade e permanecer firmes nela. Todas as heresias ao longo da história e todos os ensinamentos opostos àqueles transmitidos à única Igreja não passam de uma aniquilação do Deus verdadeiro, substituindo-O por um falso. E que comunhão pode existir entre Cristo e esses falsos deuses demoníacos? Quando o nosso Cristo retornar à Terra, Ele encontrará uma infinidade de "igrejas", falsamente assim chamadas, que possuem uma fé desonesta, por isso Ele pergunta: Porventura [o Filho do homem] achará fé na terra? (Lc. 18:8) Isso se deve ao fato de que uma fé desfigurada e distorcida não é fé alguma. Uma fé fora da Igreja Una e Apostólica nunca pode levar a um conhecimento vivo do Deus Vivo e Verdadeiro.


Deus se afastou de Seu povo nestes últimos tempos; Ele está se afastando de Seu rebanho, que pastoreou, fortaleceu e multiplicou no passado, mesmo nas eras mais sombrias de perseguição e tirania dos obreiros do diabo. Nossa terra está se tornando desprovida de Cristo e de Seus verdadeiros ungidos; esta terra, cujo solo era santificado pela adoração incessante do Senhor e de Seu Cristo, tornou-se a terra da apostasia. Por quê? Porque as pessoas abandonaram a fé de seus antepassados e a simplicidade da vida de piedade. Eles pensaram que a sobrevivência nesta terra dependia de fazer alianças com os deuses de nações estrangeiras, em vez de se apegarem à Verdadeira Fé.


Esse povo pecou diante de Deus. Eles estão se fundindo gradualmente ao espírito do mundo e ao da globalização e não querem se arrepender. Onde estão os líderes da Igreja que estão se arrependendo de todas essas transgressões? Arrependendo-se por si mesmos e por seu povo? Onde estão aqueles que usam pano de saco e acrescentam jejuns sobre jejuns para serem um exemplo para seu povo em arrependimento, santidade e Ortodoxia? Os hereges - descendentes de Balaão - profetizam para nosso povo e o afogam ainda mais nas ilusões que estão por vir, enquanto os líderes permanecem em silêncio.


"E já ninguém há que invoque o teu nome, que se desperte, e te detenhas; porque escondes de nós o teu rosto, e nos fazes derreter, por causa das nossas iniquidades..." Não te ires demais, ó Senhor! Não te lembres constantemente das nossas maldades. Olha para nós! Somos o teu povo!
As tuas cidades sagradas transformaram-se em deserto. Até Sião virou um deserto, e Jerusalém, uma desolação! O nosso templo santo e glorioso, onde os nossos antepassados te louvavam, foi destruído pelo fogo, e tudo o que nos era precioso está em ruínas; e depois disso tudo, Senhor, ainda irás te conter? Ficarás calado e nos castigarás além da conta? (Is. 64:7, 9-12)

Tornai-vos para mim, e eu me tornarei para vós, diz o Senhor dos Exércitos (Malaquias 3:7, Zacarias 1:3). O arrependimento genuíno, que nos inspira a chorar por nossos pecados, é sempre um sinal de firmeza inabalável na Verdadeira Fé; somente o arrependimento é capaz de nos tornar uma descendência abençoada que Deus multiplicará.

quarta-feira

O Farisaísmo e a Adoração a Deus - Arquimandrita Gregórios (Estephan)

 



Arquimandrita Gregorios(Estephan) – Hegúmeno do Mosteiro da Dormição da Mãe de Deus - Bkefitine


Nestes quatro domingos que antecedem o Grande Jejum, que são preparatórios para a Grande Quaresma, a Igreja nos apresenta os princípios fundamentais sobre os quais devemos edificar o nosso jejum de quarenta dias.

No primeiro domingo, chamado domingo do Fariseu e do Publicano, a parábola bíblica nos revela o espírito com o qual devemos jejuar e orar durante a Quaresma. O significado essencial desta passagem bíblica gira em torno de dois temas essenciais: orgulho e presunção, por um lado, e humildade e arrependimento, por outro. Os dois primeiros nada mais são do que uma adoração podre e falsa a Cristo, enquanto os dois últimos são os fundamentos da salvação em Cristo. Nossa salvação depende de como adoramos a Deus. Nossa adoração a Deus pode nos justificar, mas também pode nos condenar. Na Igreja, adoramos o Deus Verdadeiro, mas nossa adoração pode se tornar egocêntrica.

Na Igreja, o farisaísmo tornou-se um símbolo de orgulho e altivez. Alguns o utilizam de um ponto de vista moralista para indicar uma epidemia na sociedade; outros o utilizam para descrever qualquer pessoa que não concorda com suas posições e pensamentos.

Cristo rejeitou o orgulho farisaico e o julgou, não apenas porque o orgulho destrói toda virtude no crente, mas porque destrói todo senso de verdade que existe nele. O início do orgulho aparece no julgamento aos outros, na autojustificação e na presunção. O pecado da autojustificação é a antítese do arrependimento; não apenas faz um homem julgar-se justo aos seus próprios olhos, mas também alimenta seu egoísmo e apego aos seus próprios pensamentos e vontades.

Essas paixões graves são um véu sobre nossos olhos espirituais. É precisamente por isso que o fariseu não viu a necessidade de buscar a misericórdia de Deus e o perdão dos seus pecados. E quem vê apenas a sua própria justiça julga os outros com facilidade e os despreza. É por isso que toda queda na história e toda heresia que cresceu (e cresce) no mundo foi causada, principalmente, pelo orgulho farisaico e a convicção da autojustiça.

O homem nunca se humilhará e sentirá o peso de seus pecados enquanto contar seus feitos e se orgulhar de suas grandes obras. A enumeração de feitos e o orgulho deles é o principal combustível para o orgulho. E a maioria dos cristãos vive uma espécie de “cristianismo social” que alimenta o espírito do egoísmo, de modo que facilmente caem nas paixões da presunção, da vanglória, do orgulho… e da heresia.

Cristo quis nos advertir de cair nessas paixões mortais quando Ele disse: Ai de vós, quando todos os homens falarem bem de vós! (Lucas 6:26)

Do ponto de vista da fé, o verdadeiro farisaísmo compreende essa escuridão em que a alma orgulhosa cai, de modo que ela não faz mais distinção entre o que é do Espírito de Deus e o que é do espírito do diabo. Essa alma torna-se incapaz de discernir a verdade da ilusão. Só os humildes são verdadeiramente espirituais, porque obedecem à Igreja, à sua fé e aos seus cânones, e Deus concede-lhes o dom do discernimento e a capacidade de separar o que é verdadeiro e o que são os falsos ensinamentos que desfiguram esta Verdade. Estes (humildes) são os mestres e Padres da Igreja e os defensores de sua Fé.

Esta é a luta constante entre orgulho amaldiçoado e humildade abençoada; farisaísmo e obediência; autoconfiança e arrependimento; essa luta aumentará à medida que avançamos para o fim. O pecado do fariseu não está somente na alma que se desvia da verdade, mas naquela alma a quem a verdade é revelada, mas continua insistindo em sua ilusão; e induz os outros ao erro enquanto sugere que eles estão certos. O farisaísmo é a cegueira diante da Verdade, quando a Verdade está totalmente presente diante de nós em sua plenitude. O farisaísmo não é a adesão firme à nossa fé Ortodoxa e a nomeação de hereges e falsos mestres. O farisaísmo é a adesão patológica às nossas convicções pessoais, que se opõem aos ensinamentos da Igreja e decorrem de um espírito mundano e das instabilidades da Nova Era.

Cristo não condenou o pecador, mas Ele mesmo condenou o herege, quando disse que todas as blasfêmias são perdoadas, mas aquele que blasfemar contra o Espírito Santo nunca terá perdão, mas corre o risco de condenação eterna (Mc 3:29 ). Nossos Santos Padres entendem estes "blasfemadores imperdoáveis" como hereges e falsos mestres.

O nosso Cristo é o Cristo dos humildes, que abençoa o que a Igreja abençoa e anatematiza o que ela anatematiza. Tais pessoas não pecam contra Deus, nem contra os homens, nem contra a fé, nem contra o amor.

O amor não unifica a humanidade – a fé Ortodoxa em Deus é o que unifica os homens, de uma forma interna e íntima. Quando crêem na mesma fé, tornam-se um, e o amor sela então esta unidade, mediante a participação no único Corpo e Sangue de Cristo. Quem lê sobre o caminho da Igreja em todo o Novo Testamento com uma mente humilde, vê claramente que é um caminho, com uma única fé, que nos une a Jesus Cristo – a única Verdadeira Fé que resiste a todos os ensinamentos distorcidos e tortuosos. O 'amor', como mencionam os Apóstolos do Novo Testamento, nada mais é do que a afirmação desta unidade, uns com os outros e com Deus, entre os que estão unidos pela Fé única, que se ativa na participação no Santo Corpo e Sangue de Cristo na Eucaristia.

Quanto ao amor que não se baseia nessa Fé única, é apenas um amor externo, farisaico, um amor hipócrita, como o amor que o fariseu demonstrava para com Deus e seus semelhantes na oração, no jejum e na esmola.

O fariseu pensou que era justificado por suas obras, então ele as enumerou e confiou nelas. Quanto ao publicano, ele confiava em sua fé em Deus; a força dessa fé é revelada quando ele busca a misericórdia de Deus com tal espírito contrito. A sinceridade da fé do homem é revelada pela franca confissão de seus pecados diante de um pai espiritual na Igreja, e sua fé é fortalecida ao buscar a misericórdia de Deus com inabalável insistência. E o publicano, parando de longe, não levantava sequer os olhos ao céu, mas batia no peito, dizendo: Deus, tenha misericórdia de mim, que sou pecador (Lucas 18:13).

Esses são os sinais do verdadeiro arrependimento e autoconhecimento; O profeta Davi os descreve da seguinte forma: Os sacrifícios que agradam a Deus são um espírito quebrantado;um coração quebrantado e contrito, ó Deus, não desprezarás (Sl 50:17).

O fariseu rezava como qualquer outra pessoa, mas uma oração como a dele, com um espírito altivo e inconsciente de seus pecados, é uma oração feita aos demônios, não a Deus. Aquele que ora verdadeiramente deve ser cheio de compaixão pelos outros e amor – não julgamento – pelos pecadores. O fariseu orgulhava-se de seu jejum, enquantoobjetivo do jejum é que a alma seja esmagada e humilhada, para crescer no controle dos caprichos do corpo, na purificação dos pensamentos e na renúncia às coisas mundanas. Ele se orgulhava de dizimar todos os seus bens, enquanto o objetivo do dízimo é transformar nosso egoísmo em sensibilidade para com os outros e nos libertar da avareza e do amor ao dinheiro. Este é o espírito farisaico que se opõe ao espírito humilde - que é um espírito que ama a Cristo mais do que a si mesmo. Este é o inicio de nossa jornada rumo à Páscoa. A Igreja nos ensina através desta parábola a acompanhar o jejum com humildade, para que possamos crescer na Fé, no autoconhecimento e na consciência de nossos pecados.

O objetivo do jejum é curar a alma de seus desejos corruptos, doenças espirituais e tendências perversas. Mas o jejum é estéril sem oração focada... e a oração sincera não existe sem humildade, suspiros e arrependimento.

terça-feira

"O Bom Sacerdote" - Arquimandrita Gregorios (Estephan)

 





O Bom Sacerdote

 

Arquimandrita Gregorios(Estephan) – Hegúmeno do Mosteiro da Dormição da Mãe de Deus - Bkefitine

 

O sacerdócio cristão é uma ocupação celestial, não terrena, porque o verdadeiro sacerdote é designado por Deus, não pelos homens, e o objetivo é, antes de tudo, conduzir o povo de Deus ao Reino dos Céus.

 

É dever de todo cristão buscar sua salvação, e isso requer um líder e um professor para liderá-lo e ensiná-lo a arte da salvação. O sacerdote Ortodoxo é este líder e mestre que é chamado, pela graça do sacerdócio que lhe foi confiado, a celebrar os Santos Mistérios e auxiliar os outros na sua salvação. Mas ele mesmo deve ter encontrado o caminho para sua salvação e trabalhar para isso com seriedade. Apesar da importância de todo o trabalho pastoral e do ensino do sacerdote, sua vida em Cristo e sua luta na vida de piedade e virtude precedem todo trabalho.

O trabalho principal do padre é espiritual, mas seu trabalho pode facilmente se transformar, de espiritual em atividade social, devido a dois fatores: o primeiro fator é a fraqueza em sua vida espiritual, especialmente em sua oração. O segundo fator, que vem como consequência do primeiro, é a influência de sua Paróquia, por causa da tirania do fator social sobre o espiritual, que pode ocorrer ali. É por isso que a seriedade do sacerdote de Cristo é demonstrada pelo seu empenho em santificar-se. Ele resiste não apenas a toda influência mundana e externa sobre si mesmo, mas afeta seu rebanho e dirige suas mentes e vidas de maneira espiritual, para a salvação de suas almas.

O Evangelho separou radicalmente o espírito de Deus e o espírito do mundo. É impossível resistir ao espírito do mundo na alma humana sem a vida ascética. O amor do sacerdote por Cristo é expresso por sua renúncia ao mundo e a tudo o que há nele, e também por seu desejo de oração e jejum, e sua vigilância na luta incansável contra suas paixões e pecados. A oração pessoal de um sacerdote não deve cessar, nem por um dia, nem ele deve quebrar o jejum, independentemente das circunstâncias pastorais que possa encontrar. Isso constitui um pecado e uma entrega ao espírito deste mundo e a todos os seus desejos, e uma pedra de tropeço para seu rebanho; também os encoraja a negligenciar o jejum. É por isso que o jejum é mencionado tão estritamente nos cânones sagrados.

Deus alegremente aceita o jejum de Seus sacerdotes como uma indicação de sua aversão a seus desejos pecaminosos. Ele ouve atentamente as orações daqueles que lutam por Ele, o que prova que eles O amam mais do que a si mesmos; tais sacerdotes agradam a Deus com fé e obras. Algumas pessoas pensam que nossas obras e serviço são suficientes para agradar a Deus, mas sem uma fé forte e reta em nosso Cristo, nossas obras, por maiores que sejam, não passam de um trapo de imundícia diante dEle.

O amor do sacerdote por Cristo é mais evidente no Mistério da Eucaristia. A participação neste Mistério requer pureza de corpo e alma. O padre se prepara para a Comunhão dos Mistérios através da oração e jejum da noite anterior. Ele se prepara com muito silêncio e sua regra (canon) de oração diária. O silêncio e a oração dão ao sacerdote um estado de vigilância interna, para poder examinar seus pensamentos todas as noites e purificar sua mente de todo pensamento maldoso ou ódio, especialmente em relação àqueles que o ofendem. O sacerdote deve rezar por aqueles que o ofendem e se reconciliar com eles, considerando que Deus lhe envia tais pessoas para preservá-lo na humildade. Só a humildade abundante permite ao sacerdote conhecer a si mesmo e ver suas transgressões como pecados, de modo que não as justifica, mas se arrepende delas. O arrependimento é a primeira condição para ser digno de participar dos Mistérios Divinos.

 

A Paróquia sente a virtude do padre e sua vida de piedade - se ele reza, jejua, se arrepende, perdoa e ama. Ao mesmo tempo, também sente sua ganância e todas as suas paixões. Pois a graça do sacerdócio não esconde as paixões do sacerdote. As mais perigosas entre essas paixões são os desejos da carne, o amor ao dinheiro, a ira, a vaidade, o egoísmo e o temperamento. Quanto mais fortes essas paixões estiverem dentro dele, mais inevitável será sua queda no pecado.

O início da queda de um padre é o seu afastamento gradual da confissão de suas paixões e pecados a um pai espiritual, e sua queda se cumpre quando ele se vê perfeito em tudo e não aceita nenhuma crítica de ninguém. Quando o padre perde a vida de filho, ele perde imediatamente a posição de pai. Quando os pecados se acumulam, ele não os vê mais como pecados porque satanás os justifica para ele e o faz esquecê-los, lembrando-o apenas de suas glórias. O orgulho cresce gradualmente no padre quando ele começa a aceitar pensamentos de superioridade e altivez sobre si mesmo, dados seus talentos e a honra e confiança de seus paroquianos. Recusar a honra do povo, ou mesmo desconsiderar e fugir dela é o princípio da salvação; quando (o sacerdote) se considera o menor entre os homens e indigno, sendo concedido, pela graça e compaixão de Deus, a sustentar as coisas sagradas em suas mãos e celebrar estes mistérios temíveis. Deus ama os humildes porque eles se arrependem. Ele resiste aos orgulhosos.

Na era do globalismo religioso e do sincretismo, o sacerdote não deve ceder nenhuma parte da verdade para agradar sua Paróquia, nem em termos de fé nem dos Mandamentos. Que o sacerdote confie que Deus iluminará os humildes para que possam mudar e abraçar a Verdade ensinada pela Igreja, junto com seus Santos Concílios, enquanto os orgulhosos que resistem a essa Verdade, acabam se tornando mais insistentes em suas opiniões e convicções pessoais inspiradas pelo espírito do sincretismo.

A imagem de Moisés, e das pessoas que reclamaram com ele no deserto por quarenta anos, é uma imagem das tentações que um padre que luta pela salvação de seu povo pode encontrar em qualquer Paróquia. Como o sacerdote precisa de uma alma fortalecida pela Graça, para não fraquejar e sucumbir, ele precisa rezar incessantemente para que o Senhor ilumine seu povo no conhecimento da Verdade, implorando com lágrimas [para] que [eles] se arrependam e que encontrem a salvação. A oração de arrependimento atrai a graça do Espírito Santo, de modo que Deus é o líder deste povo, enquanto o sacerdote nada mais é que um instrumento de Deus, como outro Moisés. O sacerdote deve sempre desenvolver sua fé em Deus e confiar somente nEle, e não em si mesmo, ao pastorear seu povo. O trabalho pastoral requer paciência, paciência requer oração, e oração requer negação do amor próprio. Ele deve amar os pecadores, não os julgar ou evitá-los.

O sacerdote não deve se cansar de comemorar os nomes dos vivos e dos adormecidos no Divino Sacrifício, suplicando o perdão de seus pecados. A oração e o Divino Sacrifício oferecido pela vida de todo o mundo, antes que venha o julgamento deste mundo, é o que mantém a Graça de Deus operando neste mundo em meio a todos esses males e transgressões. Estes nomes comemorados, juntamente com o nome da Mãe de Deus e dos santos, são misturados ao Sangue de Cristo que foi derramado para nossa salvação, sendo comemorados no Santo Altar, naquela Divina Liturgia, onde o Céu e a terra, vivos e mortos, estão unidos.

É por isso também que a Divina Liturgia deve ser celebrada em todos os lugares, em todas as Paróquias, também aos sábados*, que são dedicados aos adormecidos. É dever do sacerdote recordar sempre aos fiéis que rezem pelo repouso das almas dos seus irmãos adormecidos e pelos necessitados deste Santo Sacrifício. Pois eles ainda estão vivos e compartilham conosco no mesmo Corpo de Cristo. Que o sacerdote confie que ele contribui para a consolação e conforto dessas almas, comemorando-as no Santo Sacrifício. A Divina Liturgia de sábado é tão necessária quanto a de domingo, onde lutamos e rezamos pela ressurreição de nossos entes queridos.

- O Verdadeiro Sacerdócio -

Como o bispo e o sacerdote se tornam verdadeiros sucessores dos Apóstolos e membros dessa “nuvem de testemunhas”(Hebreus 12:1)? A imposição de mãos não é suficiente. A imposição de mãos e a própria sucessão Apostólica são anuladas por qualquer desvio, mesmo que leve, dos dogmas da Fé. A Verdade Ortodoxa está acima de tudo; é o dogma reto; é o próprio amor e todas as outras virtudes; é a única lei sobre a qual se fundamenta toda a salvação em Cristo. Ensinar e defender a fé é um dever inseparável da ordem sagrada do bispo e do sacerdote. É por isso que foi estabelecido — para pastorear o povo de Deus — mas nas pastagens da fé reta, e não nos desertos dos ensinos distorcidos e do espírito da época. O bispo é, antes de tudo, um zeloso guardião da unidade da Igreja dentro da fé Ortodoxa; no momento em que as heresias são legalizadas como uma perversão, a Verdade Ortodoxa é dissolvida nelas

São Teodoro o Estudita diz: “Pois é um mandamento do Senhor não ficar calado no momento em que a fé está em perigo. Fala , diz a Escritura, e não te cales (Atos 18:9)... É por isso que eu, o miserável, falo, temendo o julgamento de Deus”.

 

Conhecimento e graus acadêmicos não são uma medida do sacerdócio; são apenas fatores suplementares. A medida é a pureza interior do homem, sua luta espiritual em obediência e sua absoluta fidelidade à Fé Ortodoxa e à Tradição da Igreja. Estas são as condições gerais do sacerdócio de que falaram os nossos Santos Padres. Caso contrário, o padre será um fardo para a Igreja, enchendo-a de pedras de tropeço. O bispo será responsabilizado por cada ordenação que não cumpra essas condições, especialmente no que se refere à fé.

O sacerdote autêntico é identificado com Cristo por meio da obediência, não da autoridade. A autoridade é completa e canônica quando se baseia na obediência. A obediência limita-se à fidelidade absoluta aos dogmas e cânones definidos pela única Igreja de CristoOs mandamentos de Cristo e os cânones da Igreja são uma lei divina que deve permanecer sempre diante dos olhos do sacerdote, dia e noite. Esta é a sua luta em um mundo que aboliu todos os estatutos sagrados que Cristo estabeleceu para o Seu mundo; nesta última era que prega, aberta e persistentemente, a lei do anticristo.

O bispo não herda o dom de profecia que existia nos profetas do primeiro século do cristianismo? Ele é designado profeta para proclamar a Verdade e revelar a ilusão vindoura ao seu rebanho. Entramos nos últimos tempos e os fiéis a Cristo esperam que alguém lhes revele o espírito do anticristo, que está operando poderosamente no mundo agora.

O bispo ou padre iludido por esse globalismo religioso, difundido pelo movimento ecumênico contemporâneo, e que, em nome do amor, mistura a Verdade Ortodoxa com várias ilusões, que salvação oferecerá ao seu rebanho? Ele só será apresentado como sendo um mau exemplo e tendo uma fé corrupta. Tal bispo ou padre esqueceu que ainda carrega o Cordeiro que lhe foi confiado durante sua ordenação – um penhor a ser entregue do mesmo modo como O recebeu – o depósito de sua primeira Fé e seu primeiro amor.



Abouna Gregorios (Estephan)

 

* O sábado é o dia em que tradicionalmente se comemora e se reza pela memória dos adormecidos. É costume monástico a celebração da Divina Liturgia em cada sábado.  Essa tradição, de qualquer modo, infelizmente caiu em desuso na maioria das Paróquias.