"A Igreja Suicida: em Corpo ou Espírito"
Arquimandrita Gregorios(Estephan) - Abade do Mosteiro da Dormição da Mãe de Deus - Bkefitine
Cristo
ressuscitou! Verdadeiramente Ressuscitou!
Cristo Ressuscitou, apesar de todas
as tentativas de Satanás para impedir Sua ressurreição. Nem as pandemias nem
todos os males deste mundo são capazes de impedir a Ressurreição de Cristo.
Cristo Ressuscitou e a criação ainda treme até os dias de hoje quando contempla
a luz da Ressurreição, assim como aconteceu há 2000 anos. Ainda existem pessoas
que compreendem a Ressurreição de Cristo e, embora sejam poucas em número,
gritam: 'Cristo ressuscitou!' E, graças aos seus gritos, a Vitória de Cristo
sobre o mal e a corrupção continua avançando neste mundo.
Agora mesmo, somos capazes de
experimentar a ressurreição de nossas almas enquanto aguardamos o dia em que
Cristo, nosso Deus, virá! Então, nossos corpos serão ressuscitados para a
imortalidade. A ressurreição da alma ocorre quando os pecados dela são
perdoados, enquanto a ressurreição do corpo é estabelecida em seu ascetismo e
sua morte em relação as paixões deste mundo. O Senhor Jesus Cristo ensinou
claramente sobre a eterna diferença entre a alma e o corpo, entre a salvação da
alma e a saúde do corpo: “Pois o que é mais fácil dizer: teus pecados foram
perdoados, ou : Levanta-te e anda? (Mateus 9: 5). Cristo claramente nos mandou
lutar pela ressurreição de nossas almas e não temer a morte de nossos corpos. O
verdadeiro medo é de que nossas almas e corpos pereçam no inferno (Mateus
10:28). Viver essa ressurreição requer primeiro a Verdadeira Fé no Filho de
Deus; "Mas sem fé é impossível agradá-Lo" (Hb 11: 6). A plenitude da
fé é a submissão do homem, em sua totalidade, nas mãos de Deus, o que ocorre
quando ele exerce plenamente a obra de Deus. Para aquele que na fé se submete
ao próprio Deus e à sua vontade, Deus se torna tudo em todos.
Através dessa fé firme e forte, pela
qual Deus se torna tudo para o homem, a Igreja pôde, desde o início, confrontar
os poderes do inferno e derrotá-los. Por meio da fé, nossos Pais expressaram
teologia, confirmaram os Dogmas da Igreja e caminharam nas trevas deste século,
apesar das perseguições e ameaças de morte: “pela fé subjugaram reinos, fizeram
justiça, obtiveram promessas, fecharam a boca dos leões, extinguiram a
violência do fogo, escaparam do fio da espada, da fraqueza se fortaleceram,
esforçaram-se na batalha ... ”(Hebreus 11: 33-39).
Como nossos Pais enfrentaram, por meio
dessa fé, as duras tentações deste mundo, da mesma forma, até hoje, eles
enfrentam os males crescentes, tanto do tipo natural quanto do tipo moral.
Entre esses males está a pandemia que está abalando o mundo hoje, e que Deus
permitiu para testar minuciosamente a fé de muitos que nEle crêem. É claro que esta pandemia, seja ela natural
ou sintetizada, foi explorada com um objetivo além do aparente, ou seja,
destruir nos crentes em Jesus Cristo o que resta da esperança na Ressurreição e
na eterna vitória sobre morte. Um plano satânico foi cumprido através dessa
pandemia que se espalhou na maioria das áreas do globo; esse plano é resumido a
seguir: promover o medo da pandemia - introduzir as pessoas em um estado de
horror - resultando no colapso da Fé viva em Jesus Cristo. Este colapso da Fé
viva, que está ocorrendo nas almas cristãs, é necessário para preparar a vinda
do Anticristo. A mídia semeou o medo da morte nas almas dos homens,
causando-lhes o pânico. Mesmo muitos cristãos que não devem temer a morte,
sabendo que a vida está nas mãos de Deus, estão em pânico por causa dessa
pandemia. Eles temem a morte do corpo, esquecendo-se do que está relacionado à
morte espiritual da alma.
Esse medo da doença e da morte
prevalece sobre as almas de muitos, levando ao colapso da fé. Isso revela como
a fé deles era fraca e frágil para começar. Quando a fé está enfraquecida, chegando
ao ponto de provocar dúvidas sobre a providência de Deus e, como resultado,
causar o temor de ir à Igreja e participar do Corpo e Sangue de Cristo, o
próprio Cristo é banido das almas desses "fiéis". A totalidade de
nossa jornada de vida até Cristo Jesus é, antes de tudo, uma jornada de fé: “e
a vida que agora vivo na carne, vivo-a pela fé do Filho de Deus, o qual me
amou, e se entregou a si mesmo por mim. ”(Gálatas 2:20). Esse medo
injustificado que o mundo semeou nas almas de muitos, deveria ter sido
enfrentado pela Igreja, fortalecendo a fé e o apego do seu povo ao Salvador,
Jesus Cristo! Mas, em vez disso, eles se renderam a esse medo junto com o povo.
O rebanho dos fiéis precisava vitalmente solidificar sua Fé em Cristo, evitando
o colapso da Fé como resultado da pressão planejada e concentrada exercida pela
mídia. Quando as Igrejas são fechadas durante as tribulações, a confiança dos
fiéis na Igreja não diminui?
Perguntamos com honestidade, não havia outro
meio ou solução gradual, levando em consideração todas as medidas de saúde,
para enfrentar essa pandemia sem que as Igrejas fossem fechadas e sem que nos
rendêssemos a um suicídio espiritual coletivo? Ir à Igreja durante pandemias,
tentações, dificuldades e perseguições não significa que estamos tentando a
Deus como se estivéssemos convidando algo a nos acontecer, mas, sim, com isso,
estamos dizendo a Ele que andamos com Ele em Fé, revelando que o que mais
precisamos é estar com Ele durante essas mesmas aflições, unidos a Ele em Seu
Corpo e Sangue, a fim de confrontar esta pandemia e os perigos das doenças, bem
como todas as outras catástrofes que nos aguardam. Quando os cristãos, durante grandes
perseguições e no período do comunismo, arriscaram suas vidas para entrar nas
catacumbas e se reunir à mesa do Senhor, eles expressaram seu amor a Cristo
mais do que em si mesmos, uma expressão de seu conhecimento de que a vida
Verdadeira existe nesta Mesa Eucarística e não em seus corpos.
Estamos testemunhando um choque entre
o intelecto do homem e a Fé. Deus deu o intelecto para ser iluminado pela fé,
mas não para que ele vagasse separado dela. Não para que duvidemos da economia
de Deus para nossa raça, identificando-se assim como autossuficientes.
Na Igreja Ortodoxa sempre ocorreu um
conflito entre estes dois princípios: racionalismo e fé-espiritualidade. Desde
os dias dos gnósticos e de Ário, e através do escolasticismo e de Barlaam, até
o racionalismo mundano perpetrado pelo ecumenismo contemporâneo, a Igreja está
em um estado de luta incessante, a fim de preservar a revelação de Deus que nos
foi oferecida por Ele e que está guardada dentro de nossa Fé Ortodoxa. Essa fé
não é apenas um dos Dogmas, mas também a Fé da piedade e da verdadeira vida
espiritual. Pela fé, o cristão submete sua vida a Cristo, sem nenhum medo do
que poderia acontecer com sua vida. No entanto, a lógica racional justifica o
medo e a fuga do homem, mesmo diante da face de Deus, a fim de proteger a vida
de seu corpo.
O ateísmo que se espalha vigorosamente
no Ocidente, e dele para o mundo inteiro, foi o resultado principal desse
racionalismo que dominou a teologia do Ocidente desde o século IX. O
escolasticismo estabeleceu o homem ocidental na racionalização de todos os
aspectos de sua vida, resultando, para eles, na adoração a Deus não mais
mantida em "espírito e em verdade", mas no intelecto e nos
sentimentos humanos. A fé que é examinada pela experiência torna Deus um Deus
vivo e não um pensamento abstrato. Assim, o homem ocidental foi conduzido do
racionalismo ao niilismo e a qualquer ateísmo que os seguisse.
Aqueles que adoram a Deus em "espírito e em verdade"
são capazes de perceber a mão de Deus e Sua sabedoria em tudo o que acontece
nesta vida. Mas o homem racionalista não pode ver nada além de sua análise
intelectual dos eventos, pois contempla tudo através das lentes de sua
lógica humana decaída. Foi isto que nos foi revelado na recente
experiência desta pandemia: alguns a consideraram um sinal da ira de Deus,
resultante de todas as iniquidades, profanações, ateísmo e apostasia que agora
dominam o mundo. Mas os intelectuais só veem nela um incidente natural, como
consequência de causas humanas ou naturais, pois para eles Deus é “amor” e
infinita misericórdia, e Ele é realmente assim. Mas aqueles que
se deleitam em suas próprias ideias, ignoram que o amor de Deus é
dado apenas àqueles que O respeitam, oferecendo arrependimento e trabalho para
guardar os mandamentos e adquirir as virtudes. Deus quer a salvação do
homem: “A quem o Senhor ama, Ele corrige” (Provérbios 3:12). Quando
falamos sobre a ira de Deus, não é que a ira e as paixões existam na
natureza de Deus; é porque o homem que é obscurecido pelo pecado não pode ver a
Deus, exceto nesse estado, o estado obscuro de sua alma reflete o dom de Deus
em si mesmo de uma maneira distorcida. Quanto mais o mal e a corrupção
estão enraizados no coração do homem, mais ele precisa de tentações mais
duras para se afastar deste mal; e o objetivo é o arrependimento e a
salvação do homem. A ira de Deus é o julgamento justo de Deus.
Os intelectuais que rejeitam essa ira divina são
geralmente aqueles que entendem o cristianismo como uma religião moral e
se esforçam para aplicar assuntos externos à lei. Seu deus é emocional e
perdoa as iniquidades dos homens, eles se arrependendo ou não, sendo
purificados de suas paixões ou não. Esse é o resultado do pensamento
protestante, que é promulgado em muitos círculos teológicos Ortodoxos,
cujo objetivo é aliviar a consciência das pessoas que
estão satisfeitas com suas paixões e não querem lutar para se
libertar delas. Aqueles que promovem o modernismo da Igreja, ou seja, que se
adaptam ao espírito da era moderna, sob a influência do ecumenismo
contemporâneo, são compatíveis apenas com esse deus, um deus criado à imagem do
homem e à sua semelhança; esse é um deus que desce ao homem, não para elevá-lo
ao nível de sua divindade, mas para coexistir com as paixões do homem.
Desde o tempo da queda, a advertência
de Deus foi claramente expressa: se você transgredir o mandamento
"certamente morrerás". Mas, se não me ouvirdes, e não cumprirdes todos estes mandamentos, E se rejeitardes os
meus estatutos, e a vossa alma se enfadar dos meus juízos, não cumprindo todos
os meus mandamentos, para invalidar a minha aliança, Então eu também vos farei isto: porei sobre vós
terror, a tísica e a febre ardente, que consumam os olhos e atormentem a alma...Se ainda com estas coisas não vos corrigirdes voltando
para mim, mas ainda andardes contrariamente para comigo, Eu também andarei contrariamente para convosco, e eu,
eu mesmo, vos ferirei sete vezes mais por causa dos vossos pecados. Porque trarei sobre vós a espada, que executará a
vingança da aliança; e ajuntados sereis nas vossas cidades; então enviarei a
peste entre vós, e sereis entregues na mão do inimigo.” (Levítico
26: 14-25).
Aqueles que confiam em sua oferta de
intelecto, em vez de confiar na Fé movida pela graça do Espírito Santo,
significam simbolicamente a maioria dos eventos da Bíblia quando estes não
estão em conformidade com seus próprios pensamentos. A Igreja observou que as
palavras de Deus na Bíblia são claras: que todas as pragas e desastres naturais
e humanos não têm outra causa exceto os pecados dos homens. Desde o início,
Deus estabeleceu uma conexão entre a criação irracional e o homem criado à Sua
imagem e semelhança, essa criação é ajustada com o arrependimento do homem e se
revolta sob a ação de seus pecados. A Bíblia é clara, Deus permite que pragas
sejam desencadeadas sobre os homens, mas o objetivo não é a vingança, e sim o
seu arrependimento. O Profeta
Jeremias diz: “Volta, renegada Israel, diz o SENHOR; e não farei cair a minha
ira sobre vós; porque sou misericordioso, diz o SENHOR, e não guardarei a minha
ira para sempre. (Jeremias 3: 12-13). O pecado separou o homem de Deus:
"Mas as vossas iniquidades fazem separação entre vós o vosso Deus, e os vossos
pecados encobrem o seu rosto de vós, para que vos não ouça" (Isaías 59:
2). Pois Deus quer corrigir Seu povo não para aterrorizá-lo e destruí-lo.
Assim, o mundo é reconciliado e escapa à ira e julgamento de Deus através do
arrependimento: "se não se arrependerdes, todos igualmente perecereis".
(Lucas 13: 3,5). São Basílio, o Grande, revela que pragas e doenças são
permitidas por Deus para curar o pecado e o mal, porque o objetivo de tais
aflições é advertir os fiéis a evitar os tormentos do julgamento eterno [1].
O
dever dos cristãos é orar sem cessar por todas as pessoas, embora cheio da
esperança de que elas venham a se reconciliar com Deus através do
arrependimento. A misericórdia de Deus continuará no mundo enquanto houver pessoas
que se arrependam no mundo. O arrependimento é realizado vivendo a vida mística
da Igreja.
Deus enviou o Profeta Jonas para
avisar o povo de Nínive que Sua ira estava chegando sobre eles. A Bíblia diz
sobre o arrependimento do povo de Nínive: "que homem e animal sejam
cobertos com pano de saco" (Jonas 3: 8). São João Crisóstomo explica este
ditado: “Ouvimos dizer que quando a cidade recebeu essas notícias, não caiu em
desespero, mas foi energizada pelo arrependimento e, embora não tivesse um
conselheiro de salvação, começou a adorar a Deus e se reconciliar com Ele".
São João continua perguntando: "O
que eles fizeram para alcançar a reconciliação?" Ele responde que foi o
arrependimento de todo o povo com seus líderes que efetuou isso: “o Livro diz:
Pois veio a palavra ao rei de Nínive, e ele se levantou do seu trono, e tirou o
manto dele, e cobriu-se de saco e sentou-se na cinza ”. Ó rei sábio! Ele
próprio foi o primeiro a declarar arrependimento, a fim de levar sua cidade a
um estado melhor. Pois quem pode ver o próprio rei lutando pela salvação e
definhar a partir de agora? As feridas da coroa são curadas por panos de saco,
ele limpa os pecados do trono sentando-se em cinzas, ele trata a doença do
orgulho humilhando sua aparência, jejuando, ele trata as feridas do luxo ... e,
ao fazê-lo, praticamente acorda todo mundo com o chamado de andar da mesma
maneira. ”
Através do seu arrependimento, eles
derrotaram os demônios que estavam tentando afastá-los de Deus. São João
Crisóstomo continua enquanto comenta o versículo “que homem e animal sejam
cobertos com pano de saco”: “ Ó ordem celestial! Que comboio que aterroriza
Satanás! Satanás estava de pé chorando ao ver todo o seu exército se voltando
para Deus e lutando contra os demônios. Havia crianças, mulheres e bebês
lutando ao lado dos homens nessa batalha, até as criaturas irracionais
participaram da guerra ”.
Desde os tempos antigos, esse é a
condição das pessoas que ouvem o aviso de Deus e se arrependem. A disseminação de pandemias não é algo novo
na história, aconteceu várias vezes. Mas a diferença está no método usado para
enfrentá-las. A própria história secular testemunha como, durante os tempos em
que desastres naturais, pragas e doenças diferentes se espalhavam entre as
pessoas, a Igreja costumava confrontá-las com uma série de obras de piedade,
como jejum por vários dias, procissões com Ícones, orações para receber A Misericórdia
de Deus e Sua compaixão pelo povo enfermo, para perdoar seus pecados. Durante
as pragas, os fiéis costumavam se esforçar, antes de qualquer coisa, para
expulsar todas as imaginações demoníacas que poderiam estar contaminando-os com
a doença, e assim, recitando os Nomes Divinos e pedindo refúgio na Igreja junto
com os santos, Objetos Sagrados e Ícones Milagrosos, eles costumavam procurar os
homens santos de Deus, a fim de pedir-lhes sua intercessão diante de Deus para deter
a calamidade e orar por sua cura [2]. Ainda mais importantes foram as ações
de arrependimento e a participação nos Santos Mistérios, este era o remédio,
além das orações pelos enfermos [3]. Diz-se da praga bubônica que atingiu
Moscou em 1770, que muitos padres resistiram veementemente às políticas
governamentais que proibiram os serviços da Igreja e as práticas tradicionais;
a resistência do clero e dos leigos resultou em um protesto arriscado, onde o
arcebispo, que era um agente do governo, foi morto [4].
A Igreja enfrentou as consequências do
pecado através de uma fé firme e do fortalecimento da piedade nas almas de seus
membros. Hoje também, se não
enfrentarmos esta pandemia atual pela oração, súplica e arrependimento, e mais
importante, pela realização das Divinas Liturgias e através do recebimento do
Corpo e Sangue de Cristo, que nos liberta da morte eterna, com o que então devemos
confrontá-la? Fugindo e se isolando? Os cristãos, nas prisões e minas durante o
exílio, perceberam profundamente sua grande necessidade de participar do Corpo
e Sangue de Cristo, de modo que seus sacerdotes costumavam celebrar a oferta
Divina nos peitos dos fiéis; o peito dos fiéis se tornou um altar para Deus.
Estamos em um momento em que precisamos do
Corpo e Sangue de Cristo, mais do que em qualquer outro momento, para que
sejamos nutridos e recebamos a força para resistir a todo mal e doença. Embora
saibamos que, com a permissão de Deus, podemos adoecer devido a esta pandemia,
os fiéis que adoecem e prosseguem sua luta na Igreja e sua participação em seus
Mistérios, são como um soldado na arena de batalha resistindo a todo o mal, não
por sua própria força, mas pelo poder do dom salvífico da Redenção. Quem
participa do Corpo e Sangue de Cristo, sabendo que é o Verdadeiro alimento para
a vida eterna, ainda pensa na morte corporal? A morte dessa pessoa, portanto,
se assemelha à morte dos mártires [5].
Alguns fiéis podem morrer antes do final da
pandemia; eles devem estar prontos, participando do Corpo e Sangue de Cristo
como provisão de sua salvação; [este] é o selo de sua passagem por todos
aqueles espíritos indisciplinados do ar.
São Cipriano de Cartago enfrentou o
sofrimento dos cristãos, que não apenas suportaram as pragas que devastaram o
império entre 250 e 270, e reivindicaram suas vidas por doenças e pela morte,
mas também as acusações dos pagãos de que essas doenças e pragas foram causadas
pela recusa dos cristãos em adorar os deuses do império. São Cipriano escreveu
um tratado “sobre a mortalidade” para firmar os cristãos em sua fé e fortalecer
essa fé diante dos perigos dessas pragas. Ele diz a eles para acolher a morte
sem temê-la; e que essa confusão diante da morte indicava um forte apego aos
prazeres mundanos; que o sofrimento e a morte pelas doenças os libertam do
mundo e os promovem mais rapidamente em direção à Glória Eterna [6].
Alguns nos criticaram de maneira
injusta e agressiva, como se estivéssemos promovendo alguma heresia horrível,
porque exigimos que as Igrejas permanecessem abertas; no entanto, estávamos
simplesmente exercitando nosso direito de expressão Ortodoxo, como membros
fiéis da Santa Igreja. A intolerância às opiniões dos outros indica um espírito
autoritário individualista e não o espírito Ortodoxo conciliar. Isso vale
quando não ultrapassamos os limites da fé e do discurso estabelecidos em nossa
tradição Ortodoxa. Todo discurso que não está enraizado na teologia de nossa Tradição Ortodoxa está enraizado na vaidade e rapidamente se transforma em
heresia. A obediência é essencial na Igreja, essa é a obediência na
Verdade Única. Tudo na Igreja deve respeitar à obediência, exceto
aquilo que entra em conflito com a Fé e os Mistérios. Assim, toda obediência que não encontra raízes na obediência à Tradição
da Igreja, que inclui a fé, os Dogmas e os cânones, é uma obediência fútil, e a
humildade correspondente (que está sendo promovida) é uma falsa humildade.
Exigir que as Igrejas se fechem e com
isso privar os fiéis do Corpo e Sangue de Cristo não deveria ter acontecido à
força, quando não há razão enraizada na Fé para isso. Não julgamos ninguém, mas
esperávamos que aqueles que resistiram agressivamente à abertura das Igrejas
por causa dos fiéis, e fizeram disso uma questão de vida ou morte, aceitassem
aqueles que desejavam manter as Igrejas abertas, e deixasse-os assumir a
responsabilidade de seus atos diante de Cristo no último dia, quando todos
permaneceremos, especialmente bispos e sacerdotes, para prestar contas, sejam
boas ou más, por tudo o que fizemos com Sua Santa Igreja.
Seria mais lucrativo para essas pessoas olhar,
por outro lado, para as questões mais perigosas que tratam da Fé e perturbam
nossa Santa Igreja, como permitir a Comunhão aos não-ortodoxos e a participação
de padres Ortodoxos em serviços liturgicos não-ortodoxos e vice-versa. Não
seria mais benéfico para eles perseguir aqueles que promovem ideias que estão
em desacordo com a Tradição Ortodoxa, e que até ressoam em seus próprios
círculos eclesiásticos? Aqueles que semeiam a ideia de secularizar a Igreja,
alterar o estilo de vida piedoso e modernizar a fé Ortodoxa começaram com a
aceitação da homossexualidade como um estado normal, a promoção de mulheres ao
sacerdócio, a troca de experiências espirituais com os heterodoxos e
finalmente, dizendo que doenças contagiosas são transmitidas através do pão e
do vinho, que o Espírito Santo transforma no Verdadeiro Corpo e Sangue de
Cristo. Dizer que o Divino Corpo de Cristo, que se tornou uma fonte para a
deificação do homem, pode ser uma fonte de transmissão de doenças, é
equivalente a dizer que o verdadeiro Corpo de Cristo, que Ele tomou em Sua
Encarnação e que Ressuscitou dos mortos e ascendeu para o céu, pode transmitir
doenças e pragas. A Igreja nunca viu no Corpo e Sangue de Cristo nada além de um
caminho para a deificação do homem e sua plena união com Deus, o Verbo, e uma
provisão para a vida eterna. Todos que pensam de outra maneira, que o Corpo e o
Sangue de Cristo podem transmitir doenças de qualquer forma, certamente está em
apostasia do Espírito Santo, que causa essa Transformação.
O Verdadeiro Corpo e Sangue de Cristo apenas
transmite a vida eterna, entrando em nosso corpo e sangue, o próprio Cristo nos
transformando em Seu Corpo e Sangue; nos tornamos um corpo e sangue deificado
pelo Corpo e Sangue de Cristo. Isso transmite doenças e germes? Na Santa Igreja
de Cristo, apenas as ideias envenenadas pela heresia transmitem verdadeiramente
pragas e doenças espirituais fatais; os germes dos ensinamentos corruptos são a
verdadeira pandemia na Igreja de Cristo, são imensuravelmente piores do que
qualquer pandemia material. Eles matam a alma e destroem a jornada para a
salvação.
Por que todos estão calados diante de todos
esses males e perversões que estão afetando a Igreja de Cristo e desorientando
sua missão de salvação da humanidade? Aqueles que falam com um entusiasmo tão
ilegal em apoio ao fechamento da Igreja, têm tanto zelo pela pureza da Fé
Ortodoxa? Eles seriam tão zelosos em aplicar os Cânones da Igreja quanto são em
se submeter às leis das nações? Todos emergiram como zelosos pela salvação dos
corpos dos fiéis, mas não lhes disseram nada para fortalecer sua fé em Cristo e
para a salvação de suas almas. Essa salvação consiste no arrependimento e na
preservação da Fé Ortodoxa, no ascetismo e na luta para guardar os mandamentos
de Cristo. Todas essas questões revelam um estado espiritual fraco e mundano
[agindo]sobre a Igreja e o desenraizamento dos fiéis da tradição litúrgica e
ascética. Este é o resultado do ecumenismo e da falta desse discernimento que
se divide entre a verdade Ortodoxa e as heresias, entre permanecer firme na
Tradição e a abertura a ensinamentos e experiências heterodoxos.
Os heterodoxos, juntamente com os Ortodoxos
que foram influenciados por eles, prometem uma salvação fácil, na qual o
Espírito sopra aleatoriamente "onde quer que Ele deseje", e assim
promovem a ideia de que Ele salvará todos aleatoriamente também. Em nossa
Teologia Ortodoxa, “o Espírito sopra onde quer que Ele deseje”, mas Ele não
deseja o que queremos (em nossas paixões de orgulho e amor próprio); antes,
como Ele é o “Espírito da Verdade”, Ele sopra aos não-fiéis, a fim de levá-los
à “Verdade” - ao verdadeiro Cristo (inalterado por ensinamentos heterodoxos). É
assim que Ele conduz aqueles que O seguem à salvação eterna.
Para aqueles intelectuais que se esforçam em
modernizar a Fé Ortodoxa, os Dogmas são nada além de princípios filosóficos e
teóricos sem valor no nível da vida prática. Mas, de acordo com a verdadeira Fé
Ortodoxa, os Dogmas são a entrada para a experiência do verdadeiro conhecimento
de Deus; um conhecimento iluminado pelos Dogmas que nos ensina sobre o Deus
vivo. “Os Dogmas Sagrados são verdades divinas, eternas e salvadoras, pelo
poder vivificador da Divindade Tri-Hipostática” [7]. Somente através do Dogma
correto somos levados à plenitude da Fé e à experiência da visão de Deus. Este
é o caminho para a cura e a salvação, que revela a Verdade Divina em sua
totalidade, enquanto traça a fronteira entre o que é Verdadeiro e o que é falso,
entre vida e morte, entre Cristo e os anticristos.
A União Europeia, na maioria de seus
países membros, impôs esse fechamento às Igrejas ortodoxas, interrompendo assim
o trabalho de santificação da criação. O que o mercado europeu não foi capaz de
realizar em nossos países, foi cumprido pelo movimento ecumênico - capaz de
fechar nossas igrejas e transferir o mistério de nossa salvação para essa peça
de teatro que eles transmitem para nossas casas através da mídia on-line; e
nossos pastores se orgulham disso, infelizmente.
Aquele que entende o Mistério da Cruz, o
Mistério de toda a obra de Cristo, e que Ele mesmo não fugiu da morte, mas foi
a ela de bom grado, a fim de Se sacrificar pela salvação de Seus amados,
entende que também é nosso dever encontrar o Senhor no Mistério de Sua morte e
Ressurreição, sem medo de doenças ou morte. Portanto, não podemos parar este
trabalho Divino em andamento, que existe apenas em nossa Divina Eucaristia. “É
a hora de o Senhor agir”, e todo tempo passado fora da Eucaristia, ou que não
recebe a força desta Eucaristia Divina, é um tempo em que o demônio está
trabalhando. Nesta Eucaristia, reiteramos todo o Mistério da Cruz e da
Ressurreição de maneira mística, o Mistério da salvação que, se interrompido,
provoca uma interrupção na jornada do homem e da criação em direção à salvação.
Para nós que somos Ortodoxos, o lugar da Eucaristia permanece totalmente
diferente do que é para os não-ortodoxos. A Eucaristia Divina nos dá o próprio
Cristo com seu Corpo e Sangue, é uma verdadeira união com Jesus Cristo, é
claro, de acordo com as Energias Divinas, não a Essência Divina. Não é um ícone
do Reino, mas a primeira experiência e uma verdadeira antecipação do Reino e da
vida Divina - uma experiência neste mundo que está sangrando das feridas de
todos os tipos de pecados, heresias e males. Nesta Eucaristia que é comemorada
com frequência, ou melhor, diariamente, a Igreja vive toda a experiência da
vida eterna. É a chave do Reino celestial, enquanto a cessação desta
Eucaristia, por meio dessa [interrupção], nada mais é do que o fechamento da
porta do Reino.
Santo Inácio de Antioquia considera
que a Divina Liturgia é necessária por duas razões: para nos preservar da morte
espiritual e "nos proporcionar a vida eterna em Cristo", é por isso
que a chama de "medicina da imortalidade". Como o corpo é necessário
para a vida da alma, a Eucaristia Divina é necessária para a criação. O corpo
precisa respirar continuamente, o mesmo acontece com a criação que precisa
dessa Eucaristía continuamente, pois, caso contrário, ela morre e toda a
estrutura de sua existência é perturbada. Essa Eucaristia é o espírito que toda
criação respira, ambas, racional e irracional, até os próprios anjos recebem
dela os meios para adorar a Deus em Jesus Cristo. Cristo ficou claro quando
disse: "Se não comerdes a carne do Filho do Homem e bebermos o Seu sangue,
não tendes vida em vós". (João 6:53).
Dias de dificuldades extremas chegarão
em breve ao nosso mundo, quando serão vistos piores e mais inumeráveis males.
“Também sabemos que nos últimos dias virão tempos perigosos” (2 Timóteo 3: 1),
porque as pessoas se afastaram da Verdadeira Fé, “dando ouvidos a espíritos
sedutores e doutrinas de demônios” (1 Timóteo 4: 1). Isto é o que o Senhor quis
dizer quando advertiu Seu povo no Antigo Testamento, de que se eles não se
arrependessem e guardassem Seus mandamentos, Ele acrescentaria sete vezes as
pragas sobre eles, e Ele reitera esse aviso das sete pragas por quatro vezes.
São Justino, o Mártir, diz que: “Deus atrasa, para a raça humana, a obra do
julgamento (o fim do mundo), pois Ele sabe de antemão que ainda haverá alguns
que serão salvos pelo arrependimento, e talvez alguns deles tenham ainda que nascer
”[8].
O fim do mundo chegará, não quando o
anticristo se tornar forte, mas quando a Igreja se tornar fraca (Arcebispo
Sergei Baranov). Se a força da Igreja existe em seus Mistérios, e especialmente
no mistério da Eucaristia, então sua fraqueza, e antes sua morte, é encontrada
na interrupção dessas Liturgias.
Também
devemos considerar que, como a Igreja se rendeu com tanta facilidade por causa
dessa pandemia, até o fechamento de suas portas, o que ela fará quando o Anticristo
chegar? Algum de nós faz esta pergunta? A interrupção dessas Liturgias, embora
temporária, não passa de um sinal entre os sinais do fim dos tempos. Quanto aos
últimos dias, Santo Efraim, o Sírio (do século IV), revela que: “as Igrejas
pateticamente chorarão pelos serviços sagrados que deixarão de ocorrer nelas e
não haverá mais oblações Eucarísticas” [9]. A Igreja de Cristo, que é sempre
forte e vitoriosa sobre Satanás, o pecado e a morte, e a respeito da qual o
Senhor prometeu que os portões de Hades não prevalecerão sobre Ela, está se
submetendo a isso tão simplesmente? Isso não revela sua fraqueza e a
fragilidade em sua jornada terrena?
Cristo
está em Sua Igreja e com Sua Igreja. Cristo fez de Seu Corpo uma Igreja e tudo
o que acontece a Igreja, acontece com o próprio Cristo. Pois todo o Mistério de
Cristo, o Mistério de Sua Divindade e Encarnação, existe em Sua Igreja, “a
comunhão do mistério, que desde os séculos esteve oculto em Deus, que tudo
criou por meio de Jesus Cristo; Para que agora, pela
igreja, a multiforme sabedoria de Deus seja conhecida dos principados e
potestades nos céus,”(Efésios 3: 9-10).
Todas
essas lutas espirituais deveriam ocorrer com piedade, pois essa era “a prática
dos santos em todas as épocas”. Santo Atanásio nos exorta a que também seja assim
o “nosso caminho nesta era atual”, para que possamos celebrar com eles a festa que
o Verbo Divino nos convida, “para o que é esta festa, senão para a adoração
contínua de Deus, o conhecimento da piedade e a oração incessante de todo
coração ”[10].
—————————
[1]
São Basílio, o Grande, Quod Deus non est auctor malorum 5 em PG. 31, 337Cff
[2]
Procópio, BP 2.22.10–12, pp. 454–57; semelhante em Lemerle, Les plus anciens
recueils 37, p. 78. Para a igreja como santuário e local de cura, Vie de
Theodore de Sykeon 8, pp. 7–8; Veja: Dionysios Stathakopoulos, Crime e Castigo,
A Praga no Império Bizantino, 541–749 em Praga e o Fim da Antiguidade, p.
109-110.
[3]
Peregrine Horden, Doença e Cura, Cristandade Medieval Primitiva c. 600- c.
1100, The Cambridge History, p. 430
[4]
Alexander, Peste Bubônica no início da Rússia moderna, 186-95; Veja: Jo N.
Hays, historiadores e epidemias, em: Praga e o fim da antiguidade, p. 41
[5]
Eusébio de Ceasaria, Eusébio. HE 7, 22, 7
[6]
São Cipriano de Cartago, De mortalitate 1–17
[7]
São Simeão, o Novo Teólogo, (Centurie Ascétique et Gnoséologique, 12) P. Justin
Popovitch, Les Voies de la Connaissance de Dieu, Tr. Jean-Louis Palierne, L'Age
D'homme 1998, p. 155
[8]
São Justino, o Mártir, I Apol. 28, 2
[9]
Santo Efraim, o Sírio, Τόμ. Δ΄, 198 και σ. 126-127
[10]
Santo Atanásio, o Grande, Επ. 11, 11